A véspera do voo havia sido um dia tristíssimo. Pensei em não embarcar, mas desmarcar a viagem daria mais trabalho do que ir em frente e cumprir o planejado. Cheguei ao Amazonas sem fome, sem desejo. Pra minha surpresa, ambos seriam restaurados antes do que eu poderia supor.
A exuberância da natureza e da cultura naquela região relativiza até a dor. Exuberância que os restaurantes locais traduzem com simplicidade. Sorte minha, pois a alma combalida não resistiria a pompa e protocolo à mesa naqueles dias. Na riqueza da cozinha generosa, descomplicada e cheia de sabor, a fome encontraria o caminho de volta.
Foi assim com o farto desjejum dos típicos cafés regionais. Há muitos deles em Manaus e escolhi o CAFÉ REGIONAL NAÍZA apenas por ser o mais próximo ao hotel onde me hospedei durante a rápida passagem pela cidade.
Matamos a sede com sucos de graviola e cupuaçu, enquanto esperávamos pela tapioca de queijo coalho, das melhores que já comi. Só isso valeria por um almoço, mas eu não podia sair sem experimentar o pé de moleque, que ali se trata de uma deliciosa receita de massa puba com castanha, assada em folha de bananeira.
Conforto igual eu encontraria nas muitas refeições que teriam nos peixes e na farinha de mandioca seus grandes protagonistas.
Em Manaus, destaco duas delas. No TAMBAQUI DE BANDA, ao lado do belo Teatro Amazonas, a incontornável banda de tambaqui na brasa foi servida com baião de dois, vinagrete e farofa – ainda pedi à parte uma porção de farinha do Uarini, que eu não sou de ferro.
No BANZEIRO, casa do chef Felipe Schaedler, houve um inesquecível matrinxã assado, recheado com farinha do Uarini, também acompanhado de baião de dois, vinagrete e ótima farofa, além de uma atordoante porção de banana pacovã frita.
Já em Novo Airão, no restaurante flutuante FLOR DO LUAR, a costela de tambaqui e o escabeche de tucunaré – na invariável companhia de farofa, vinagrete, baião e banana pacovã – tinham como bônus um cenário único. Não bastasse o prazer de almoçar dentro do rio Negro, fomos presenteados com um inesperado banho de chuva, desses capazes de lavar o que há de mais recôndito em nós.
Rememoro aqueles dias e me pego pensando nas palavras do personagem Tadeus no livro Requiem - uma alucinação, de Antonio Tabucchi: “Todos os medicamentos para a alma são uma porcaria, disse o Tadeus, a alma cura-se com a barriga.”
Café Regional Naíza – Avenida Tancredo Neves 220 - Manaus
Tambaqui de Banda – Largo de São Sebastião (próximo ao Teatro Amazonas) - Manaus
Banzeiro – Rua Libertador 102 – Manaus
www.restaurantebanzeiro.com.br
Flor do Luar - Rua Presidente Getúlio Vargas s/n (píer em frente à Galeria Jirau) – Novo Airão